A pintura, rodeada por uma moldura simples de ouro plano em cujas laterais, inferior e direita, se pode ler: «anv[n]cio · vobis · gavdiv[m] · magnv[m] · q[ui]a · hodie · nat[us] · est · /salvator · mv[n]di», mostra, no primeiro plano, três pastores em volta de uma fogueira. O pintor, Jean Bourdichon, mostra os diferentes estados, físicos e psicológicos, de cada um: um dos pastores assinala a aparição que surge por cima deles; o da direita pára de tocar a gaita-de-foles para observar a aparição e, como a sua luz é cegante, usa a mão direita como viseira; o terceiro ajoelha-se e abre as suas mãos em sinal de surpresa; se não fosse pelos gestos dos braços e das mãos, se conseguiria, só pelo resto do corpo, um efeito de simetria quiástica. No segundo plano, um rebanho de ovelhas. Depois, dois pastores a olhar para o alto e mostrando diferentes formas de reagir perante a visão: o da esquerda estende uma das suas mãos; o da direita protege o seu rosto com o seu braço. Atrás, Belém, sob o aspecto de uma grande cidade fortificada, e, à direita, outros dois pastores, que, junto a uma fogueira, guardam o gado e começam a dar-se conta da aparição do anjo, como se observa pelas suas cabeças levantadas e o braço erguido para proteger o seu rosto de um deles. A paisagem é cercada por massa rochosas, montes e cidades ao fundo. Na parte superior central, um anjo vestido de branco sobre um espaço dourado percorre o céu – apreciando-se as dobras de tal acto como dobras nebulosas – e, dirigindo-se aos pastores, aponta para Belém. Deve destacar-se o formidável cuidado com que Jean Bourdichon trata os traços dos pastores, rudes mas nobres, nunca caricaturados, assim como o cuidado com a luz, que estabelece dois focos lumínicos: o inferior, dado pela fogueira, cujo resplendor se reflecte gradualmente nos corpos dos três pastores e o superior do anjo, cuja luz banha os rostos dos pastores do primeiro plano e os corpos dos do segundo. Outro aspecto notável é a representação de diversas texturas: a lã das ovelhas, os diferentes tipos de tecidos e as peles curtidas dos pastores em contraste com a tez suave do anjo. Do mesmo modo, o estudo espacial é totalmente convincente: tomando um ponto de vista um pouco mais alto que o do homem do primeiro plano que aponta para o céu, da impressão de que o espectador faz parte da cena, voltando a vista, lentamente, para o segundo plano, com os pastores que estão de pé, que por sua vez conduzem directamente à visão angélica. Desta forma, Jean Bourdichon manipula a psicologia visual do espectador, conduzindo-o gradualmente à surpresa da aparição celeste.
O anúncio aos pastores é a primeira epifania; a sua imagem é a do povo judeu a quem primeiro foi dada a notícia do nascimento de Cristo. Desta forma, também se deve ver, segundo os Padres da Igreja, um tipo dos futuros sacerdotes velando pelos fiéis contra os perigos do mundo; desta forma, e resplendor visto pelos pastores é a graça que se derrama sobre os sacerdotes que cumpriram bem a sua missão.