A pintura, pertencente à primeira fase de realização do
Breviário, pertence o Mestre do Livro de Oração de Dresden e situa-se no saltério; concretamente, como ilustração do salmo 68: no centro de uma construção de planta centralizada, encontra-se o rei David, como se pode ver pela coroa régia sobre a sua cabeça, a gola de arminho e a harpa –sem cordas– caída à sua direita; a ler um códice sobre um estrado. Rodeiam-no onze cantores que, quer seja sobre faldistórios, ou de joelhos, têm livros; todos trajam vestes de aspecto judaizante e flores alegóricas –lírios e rosas brancas, símbolos da pureza e da fé respectivamente, e rosas vermelhas, relativas à caridade–. Um aspecto iconográfico surpreendente deve-se ao facto da maioria dos cantores mostrar a boca aberta para realizar as suas orações, o que é absolutamente incomum na tradição medieval, visto que a boca aberta, na maior parte das representações, obedece a personagens de baixa posição moral ou social. Sobre eles, aparecem nove medalhões: o do extremo esquerdo mostra três mártires: São Sebastião, São Lourenço e São Estêvão–; o da direita, uma grande construção a arder no meio de uma cidade fortificada –por debaixo, uma inscrição onde se lê: «
destructio Jhe[
rusa]
l[
e]
m»; por fim, no centro superior da composição, sete adornos circulares emoldurados em ouro, como os anteriores, apresentam cenas da Paixão de Cristo –Jesus perante Anás, os ultrajes, o Senhor perante Caifás, flagelação, coroação de espinhos, Jesus Cristo a caminho do Calvário, crucificação; por debaixo, uma inscrição dourada onde se lê: «
misteria passionis xpristi·».
O saltério oferece um vasto campo para ilustrações, uma vez que no seu texto não são narrados acontecimentos específicos. Se as cenas que representam a vida de David foram, obviamente, as mais representadas, no
Breviário de Isabel a Católica, dá-se uma ênfase particular na construção, destruição e reconstrução de Jerusalém e ao seu Templo e, como é caso desta pintura, a cenas de celebração de cantores e músicos sob a direcção de David, não havendo nenhum ciclo semelhante em qualquer outro códice contemporâneo. É possível que a iconografia do saltério tenha sido influenciada pelo comentário aos salmos do monumental
Postillae perpetuae in universam S. Scripturam de Nicolás de Lyra (1270-1340).